Inicio essa resenha questionando minha capacidade de fazê-la, mas não me obstruindo, previamente, a publicá-la. Isso porque, uma das virtudes da minha nova “edição humana”, como teoriza Machado de Assis com as memórias de seu personagem Brás Cubas, valoriza os processos e, por mais que não consiga ficar sem atualizações intermediárias, encontra-se em sua terceira edição.
Antes de fazer essa leitura, estudei sobre o autor e sobre as perspectivas da crítica literária, haja vista que essa é uma obra marcada por uma estética a qual faço pouco domínio técnico, e que é muito representativa para o escritor reconhecido positivamente pela crítica internacional. Volto-me, para estudar as obras machadianas, a “Memórias póstumas de Brás Cubas”, primeira obra do que, academicamente, reconhece-se como segunda fase de escrita do autor. Dessa forma, debrucei-me sobre ensinamentos relativos à vida humana e à língua portuguesa, que diga-se de passagem é bem explorada na obra.
Tomada de tamanha autenticidade - e falo isso com total orgulho de ser brasileiro e discordar da dúvida, se é que posso intitula-la assim, de Harold Bloom ao caracterizar a escrita machadiana -, Memórias póstumas de Brás Cubas é um texto marcado por críticas sociais dentro de acontecimentos cotidianos embaçada pelas memórias de um destemido defunto - “advirta que a franqueza é a primeira virtude de um defunto” - o qual conceitua diversas práticas da burguesia com seu pessimismo irônico que se fosse mais fantasioso e menos realístico, seria - mais - engraçado.
Nas entrelinhas, percebemos o quanto diversos valores da sociedade fluminense de três séculos atrás continuam impregnados contemporaneamente, sobretudo, estando cada vez mais evidentes no que vivemos desde 2018, que interpreto como um processo de ruralização transformador, tornando o Brasil um país ainda mais agrário e dependente internacionalmente.
Em diversos momentos o livro aborda, por meio da visão de Cubas - burguesia - a escravidão tão presente no Brasil do século XIX, entre eles o trecho abaixo:
"um dia quebrei a cabeça de uma escrava, porque me negara uma colher do doce de coco que estava fazendo, e, não contente com o malefício, deitei um punhado de cinza ao tacho, e, não satisfeito da travessura, fui dizer à minha mãe que a escrava é que estragara o doce por pirraça".
Depois dessa leitura, eu tive ainda mais convicção do que penso sobre Monteiro Lobato. Tomei um posicionamento há pouco tempo sobre a polêmica que o envolve. Agora, quando me falam que temos que entender que Monteiro Lobato era escravocrata por ser algo comum à sociedade do século XIX/XX eu sempre penso: ou ele não sabia ler/não tinha acesso às obras do século que precedeu suas publicações ou ele não interpretava o mínimo possível da ironia machadiana, o que nos leva novamente a primeira hipótese.
Seria desnecessário ficar enaltecendo uma obra aplaudida internacionalmente por todos aqueles que entendem muito mais de literatura do que eu com meu simples compartilhamento de experiências intencionado a incentivar leituras, mas essa é realmente uma obra brilhante. Por isso, compartilho que minha experiência foi muito rica e engrandecedora e, por isso, recomendo que leiam também. Termino com esse ilustre início: "Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas".
Nota aos leitores internacionais: recentemente, a Penguin Books publicou o título em uma versão para os leitores anglófonos que, não sei se pelo pequeno número de exemplares ou pela extraordinária procura, está sempre esgotada.
Muito bem... Gostei de ler!
ResponderExcluir-
Do sombrio se afastam as nuvens altas
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Beijo, e uma boa noite!
Olá!
ResponderExcluirComo você está? Espero que esteja bem.
Eu me recordo de ter lido esse livro para um trabalho escolar, mas acho que minha memória já arquivou a história. Amei a resenha.
Beijão!
Lumusiando
Oi, Wallace. Como vai? Este clássico de Machado de Assis é muito bom! O li já faz tempo, mas fiquei com vontade de o ler novamente. Ótima resenha. Abraço!
ResponderExcluirhttps://lucianootacianopensamentosolto.blogspot.com/
Olá, Wall! Recebi sua visita no meu blog e vim retribuir, mas acabei me surpreendendo com essa resenha super bem escrita e tão rica! Meus parabéns pelo texto, ficou maravilhoso!
ResponderExcluirMemórias Póstumas de Brás Cubas foi o primeiro livro do Machado de Assis que eu li, e me cativou de tal forma que depois li quase todos os livros dele. Amo a escrita dele, a ironia e o sarcasmo que ele usa, a forma como ele desenvolve a narrativa. Sou uma grande fã do autor e me orgulho dele ser brasileiro, e de ter fundado a Academia Brasileira de Letras.
Um abraço!
Andressa Soriano
Hospedaria de Palavras
Meu Deus, viajei lá pra época do meu Colegial agora :)
ResponderExcluirAdorei teu post.
Abraço !
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